Efeitos de precipitados sobre as propriedades mecânicas do aço inoxidável superduplex UNS-S32760

Os aços inoxidáveis duplex (AID) e superduplex (AISD) são ligas que se caracterizam por apresentar uma microestrutura composta por frações volumétricas similares das fases ferrita e austenita. Dependendo da composição química e do tratamento termomecânico aplicado, a microestrutura dos aços inoxidáveis AID e AISD poderá apresentar, além das fases ferrita e austenita, fases intermetálicas deletérias. Portanto, neste trabalho foi realizado um estudo com o objetivo de analisar a influência da precipitação das partículas de segunda fase nas propriedades mecânicas do aço UNS-S32760. Para tanto, tratamentos térmicos de solubilização e envelhecimento foram realizados visando a precipitar frações volumétricas distintas destas fases no material em estudo. Após o tratamento térmico, foram realizados ensaios mecânicos de compressão e dureza, sendo que tais resultados indicam forte correlação entre as partículas de segunda fase e as propriedades mecânicas do aço inoxidável superduplex UNS-S32760.

 

Aços inoxidáveis duplex (AID) e superduplex (AISD) são caracterizados por uma estrutura de duas fases, compreendendo uma mistura de grãos de ferrita (d) e austenita (?) em frações volumétricas aproximadamente iguais [1]. Esta microestrutura, quando isenta de partículas secundárias, oferece uma combinação de alta resistência mecânica, resistência à corrosão e boa soldabilidade[2].

Atualmente, os AISD são muito empregados nos setores petroquímico, energético, naval e offshore, tendo vasta aplicação em vasos de pressão, trocadores de calor, tubulações, bombas e em componentes onde a produção contínua é essencial e o custo não é a maior limitação. A Tabela 1 indica a composição química do aço inoxidável superduplex UNS-S32760, em estudo.

Para a conformação as fases ferrita e austenita, grande variedade de fases secundárias “indesejáveis” pode se formar no intervalo de temperatura compreendido entre 300°C e 1050°C durante o envelhecimento isotérmico ou um tratamento térmico incorreto[3]. Dentre outras, podem ser observadas as seguintes fases: fase Sigma (s), Cr2N, CrN, austenita secundária, fase Chi (?), fase ?, fase R, M7C3, M23C6, fase e (Cu), e fase t; isto se deve, essencialmente, à instabilidade da ferrita.

As fases mais nocivas são os intermetálicos ? e s, que surgem em frações volumétricas superiores às dos outros compostos intermetálicos, diminuindo a resistência à corrosão e as propriedades mecânicas desta classe de aços. Segundo Martins[4], o efeito fragilizante da fase s é bastante pronunciado, pois este microconstituinte precipita nos contornos de grão formando uma rede contínua, além de apresentar uma dureza aproximada de 800 HV. Um resumo contendo algumas características destas fases secundárias pode ser encontrado na literatura[5].

Neste trabalho, foi analisada a influência da precipitação das partículas de segunda fase nas propriedades mecânicas do aço UNS-S32760 através de ensaios mecânicos. Foram realizados tratamentos isotérmicos em três diferentes tempos e temperaturas, objetivando-se a precipitação de diferentes frações volumétricas das fases deletérias na microestrutura do material em estudo. Posteriormente, o material foi submetido a ensaios mecânicos de compressão e dureza.

Assim, o presente trabalho objetiva analisar a influência da precipitação das partículas de segunda fase, anteriormente descritas, nas propriedades mecânicas do aço UNS-S32760.

 

Material e Métodos

Material

O material examinado neste estudo foi o aço inoxidável superduplex UNS-S32760, cuja composição química é descrita na Tabela 1.

Os Tratamentos Térmicos de Solubilização e Envelhecimento

Os tratamentos térmicos de solubilização e envelhecimento são os tratamentos térmicos utilizados com maior frequência no processamento dos aços inoxidáveis AID e AISD e são descritos na literatura[6].

Em particular, o tratamento térmico de solubilização promove a dissolução das fases que, porventura, tenham precipitado durante a manufatura do material em temperaturas inferiores a 1050 °C; além disso, ele promove o ajuste entre as frações volumétricas das fases d e ?. Neste trabalho, o aço UNS-S32760 foi recebido na condição de solubilizado na temperatura de 1100 °C por 4 horas.

Os tratamentos térmicos de envelhecimento, por sua vez, foram realizados com o objetivo de precipitar, intencionalmente, partículas de segunda fase com frações volumétricas distintas. Assim, as temperaturas utilizadas nos tratamentos térmicos de envelhecimento foram de 700 °C, 800 °C e 900 °C, enquanto os tempos de exposição em forno foram de 20, 50 e 120 minutos.

Ensaios mecânicos

Neste estudo, foram realizados ensaios de compressão e dureza. A preferência pelo ensaio de compressão se justifica pela sua similaridade ao processo de conformação mecânica (forjamento).

Os ensaios uniaxiais de compressão foram realizados segundo a norma ASTM E9 – 09 em uma máquina de ensaios universal EMIC, modelo DL 60000. Foram utilizados os seguintes parâmetros: (i) velocidade de deformação igual a 3 mm/s, (ii) lubrificante Starrett M1 e (iii) corpo de prova cilíndrico com altura de 25 mm e diâmetro de 13 mm, Fig.1. As medidas de dureza foram realizadas em um microdurômetro Insize, modelo ISH-R150.

Os dados obtidos através do ensaio de compressão seguiram o ajuste correspondente à equação de Ludwig-Hollomon e os valores do coeficiente de ajuste, R2, são relativos à função potência.

 

Resultados

Em um diagrama tensão-deformação, observam-se duas regiões características: (i) zona elástica e (ii) zona plástica. Entretanto, para a conformação mecânica, a região mais importante situa-se entre o limite de escoamento e o limite de resistência. Dessa maneira, torna-se de fundamental importância a determinação da tensão que provoca o escoamento do material. Esta tensão, também denominada resistência ao escoamento, é função do material, microestrutura, temperatura, grau de deformação e velocidade de deformação[7].

A Fig.2 mostra as curvas de escoamento para as condições descritas em Materiais e Métodos. Na Tabela 2 são apresentados os principais parâmetros referentes ao cálculo da tensão de escoamento, além da dureza.

 

Resultados e Discussão

A análise dos diagramas ternários Fe-Cr-Ni apresentados em um trabalho realizado previamente[3] e calculados para o intervalo de temperaturas compreendido entre 600°C e 1000°C permite observar a evolução da fase s. Percebe-se que a maior fração volumétrica desta fase encontra-se entre as temperaturas 800°C e 900°C, concordando com os resultados de dureza obtidos.

Em particular, houve um rápido aumento de dureza para curtos intervalos de tempo de exposição na temperatura de 800°C. Esse fato se deve ao grande incremento em volume da fase s nesta temperatura, além das outras fases presentes, de acordo com a literatura[3,4].

A análise das curvas de escoamento juntamente com os dados descritos na Tabela 2 demonstram a relação direta entre a dureza, o aumento da resistência mecânica do material e a deformação máxima.

No ensaio uniaxial de compressão houve um grande aumento da fragilidade do material para as temperaturas de 800°C e 900°C. Isso se deve à presença de fases secundárias, as quais aumentam o número de interfaces e conduzem a um agravamento do comportamento mecânico. Além disso, uma vez que as fases secundárias são descontinuidades estruturais rígidas, a sua presença provoca uma intensificação da tensão tornando essas partículas sítios de iniciação preferencial para trincas, o que reduz as propriedades mecânicas de uma maneira geral.

 

Conclusão

Conforme descrito anteriormente, a influência da precipitação de fases deletérias nas propriedades mecânicas do aço UNS-S32760 foi analisada em três diferentes tempos e temperaturas, permitindo as seguintes conclusões:

I. Os resultados demonstraram que as partículas de segunda fase, especialmente a fase s e a fase ?, influenciam negativamente as propriedades mecânicas do material, aumentando a sua fragilidade.

II. Observou-se uma relação direta entre a dureza e o tempo de exposição nas temperaturas analisadas, conforme pode ser observado na Tabela 2. Entretanto, na temperatura de 800°C, a cinética de formação da fase s é muito rápida. Esse fato fica evidenciado pelo rápido incremento da dureza em curtos intervalos de tempo durante o tratamento térmico de envelhecimento isotérmico.

 

Agradecimentos

À Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CAPES, pela bolsa de estudos recebida. À empresa Multialloy – Metais e Ligas Especiais LTDA., especialmente ao MSc. Eng. Cesar Santaella.

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[1] WEBER J. Materials for Seawater Pumps and Related Systems. Internal Technical Publication. Winterthur: Sulzer Brothers Limited; 1986. p.1–12;
[2] BONOLLO F., TIZIANI A., FERRO P. Duplex Stainless Steels. 1ª ed. Iris Alvarez Armas, Degallaix-Moreuil S. Great Britain: John Wiley & Sons; 2009. p.141-155;
[3] HATWIG R. A., HECK N. C., ROCHA A. S., KEMPSKI, L. A. Caracterização das Fases de Aços Superduplex Através da Simulação Termodinâmica-Computacional. Anais do 69° Congresso Anual da ABM; 2014. p.1680-1687;
[4] MARTINS M. Caracterização Microestrutural-Mecânica e Resistência à Corrosão do Aço Inoxidável Superduplex. ASTM A890 / A890M Grau 6A, Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, Interunidades EESC-IFSC-IQSC, 2006;
[5] LO K.H., SHEK C.H., LAI J.K.L. Recent Revelopments in Stainless Steels. Materials Science And Engineering R. 2009;65:39-104;
[6] KRAUSS G. Steels: Heat Treatment and Processing Principles. ASM International, 1995;
[7] SCHAEFFER, L. Conformação Mecânica. 1 ed. Porto Alegre: Ed. Imprensa Livre, 1999.