José Benedito nasceu em 1958 em Itajubá, Minas Gerais. Durante os últimos 26 anos ele foi o responsável pelo tratamento térmico da Embraer, a terceira maior fábrica de aviões do mundo. Neste departamento ele não só tratava peças e partes para os aviões produzidos pela empresa, mas também para a Boeing e a McDonnell Douglas, dos EUA.
Em 1975, depois de concluir os estudos no SENAI de Itajubá, Zé Benedito, como é mais conhecido, queria trabalhar em uma ferramentaria como ajustador mecânico, que tinha sido sua graduação no SENAI. Conseguiu uma vaga na então Fábrica de Armas de Itajubá, atual IMBEL, Indústria de Material Bélico do Brasil. Foi trabalhar na área de tratamento de superfície, que ficava ao lado do setor de tratamento térmico. Ficou lá um ano e meio, saindo para servir no Batalhão de Engenharia do Exército, sediado dentro da mesma área da Fábrica de Armas. Quando saiu, trabalhou em outras empresas, até que ficou sabendo que a empresa havia sido transformada na IMBEL, que estava admitindo trabalhadores. Foi se apresentar e encontrou uma fila de candidatos. Companheiros que passavam por ali o reconheceram e avisaram o seu ex-chefe, que o admitiu imediatamente.
Voltou para a galvanoplastia, mas de vez em quando era emprestado ao tratamento térmico. Ele conta que lá lavava peças, colocava carga no forno de pré-aquecimento, removia sal com escovinha e água. Foi fazer um curso técnico de mecânica. Trabalhando e estudando à noite. Seu professor de mecânica também ministrava a matéria tratamento térmico. Ali, José Benedito teve o primeiro contato com as curvas TTT, com o diagrama ferro carbono. Começou a ligar a teoria com a prática do dia a dia na IMBEL, mesmo trabalhando como ajudante. Quando chegou o dia da prova, ele tinha estudado a fundo tudo aquilo, deixando as outras matérias em segundo plano. No outro dia, o professor, que também trabalhava na mesma empresa, veio ao seu setor e anunciou que ele havia tirado 10 em tratamento térmico e que até os diagramas ele havia conseguido responder. Ninguém mais havia conseguido responder as 10 questões. Zé Benedito conta que para ele aquilo foi o maior estímulo para ele ir para a área de tratamento térmico. O professor lhe sugeriu mudar para este setor em definitivo.
José Benedito conta que na mesma hora procurou o supervisor da galvanoplastia e lhe disse que queria ir para o tratamento térmico. Este foi falar com o engenheiro químico responsável pela área, que era um Capitão do Exército, dizendo que o Zé Benedito queria ir para a área de tratamento térmico em definitivo, pois havia se identificado com a área. Acabou sendo chamado pelo Capitão, um engenheiro metalurgista que era o diretor do tratamento térmico. O Capitão o chamou na sala dele e disse:
– Você sabe o que está encarando, rapaz?
– Eu sei que o negócio não é fácil, não.
– Então saiba que para você ser um especialista você primeiro vai ter que operar.
– É comigo mesmo.
– Vou te emprestar um livro, para você estudar, e vou te cobrar. Cada duas ou três semanas eu te cobro um assunto.
Aí ele tirou o livro “Aços e Ferros Fundidos”, de Vicente Chiaverini, da gaveta. José Benedito confessa que mergulhou naquele livro, chegava do colégio 11 horas da noite, ficava até 2 horas da manhã estudando. E não pararia mais de ler e estudar sobre tratamentos térmicos.
Um dia, os fornos a banho de sal de seu setor ganharam um concorrente de peso: a empresa adquiriu um moderno forno de atmosfera controlada IPSEN T4. Ele acompanhou atentamente a instalação do equipamento, e, no primeiro dia de operação, o chefe lhe sugeriu o segundo turno, pois no primeiro os técnicos da empresa estariam colocando o forno em funcionamento. Quando chegou, viu a dificuldade do pessoal para conseguir atmosfera carbonetante. Não conseguiram e deixaram a incumbência para o próximo turno, com Zé Benedito. Ele imaginou que talvez a dificuldade fosse o fato de o forno ainda não ter atingido o ponto de saturação de carbono. Quem sabe, pensou ele, a parede do forno é nova, o refratário, a parte metálica, e tem que saturar para obter uma atmosfera cementante. Tirou a carga, injetou propano por mais de uma hora, o máximo que conseguia injetar. Ligou o Dew Checker e viu que o ponto de orvalho começava a cair e a atmosfera estava enriquecendo. Entrou com a carga, esperou estabilizar e chamou o chefe. Foi promovido.
Passou a liderar o grupo de tratamento térmico de aço ferramenta. Ficou na empresa até 1984. Trabalhava na COFAP, hoje MAHLE, quando chegou em casa em um dia de 1986 e a esposa lhe esperava com um telegrama na mão.
– Tem uma boa notícia para você. A EMBRAER de São José dos Campos está te chamando.
Ele tinha entregado alguns currículos naquela cidade, quando em visita ao irmão, que ali morava.
Apresentou-se na Embraer para a entrevista, eram oito candidatos no total. José Benedito diz que a maioria exibia grandes conhecimentos, que não se comprovaram depois na prova teórica. Sobrou ele e um jovem, que trabalhava como ajudante em um tratamento térmico local. Os dois foram fazer a prova prática, na área do TT. Andou a seção toda com o encarregado, que lhe fazia perguntas sobre tipos de fornos, aços, processos, temperaturas.
– O que você conhece de tratamento térmico de alumínio?
– Nada. Já li alguma coisa a respeito, mas nunca fiz.
– E de aço?
– De aço a gente tá em casa.
– Então vamos lá no tratamento térmico de aço. Que forno é esse?
– Um TOe 50/80. O sal parece ser um GS 540-R2.
– É isso mesmo, legal. E esse forno aqui, você conhece?
– Conheço.
– Que forno que é?
– GSO, atmosfera gasosa.
– Se você for tratar um aço tipo VK 10, que temperatura você utiliza?
– 1180°C.
– Ô louco, rapaz.
– Eu faço isso todo dia. Semana inteira tratando aço ferramenta.
– Que você faz lá?
– Cementação, tudo que vier. Faço recozimento, normalização em caixa, cementação líquida e gasosa, nitretação líquida, têmpera em banho de sal e gasosa, têmpera por indução. Restauração de carbono de peça microfundida, metalografia.
– Que escola que você estudou?
– Dentro da Imbel. Me deram a liberdade de aprender e eu aproveitei.
– Para mim é o suficiente. Vem comigo.
Foi contratado.
Ainda durante o período de experiência, o encarregado do setor lhe procurou para saber se já tinha alugado casa em São José dos Campos. A família ficara em Itajubá, ele morava em um quarto alugado em São José.
– Não posso, como vou alugar se ainda não acabou a experiência?
– Arruma a casa, rapaz.
E, tirando da gaveta a documentação da experiência, completou:
– Já assinei, ó. Pode arrumar a casa. Não tem mais perigo.
Foi alugar a casa, trouxe a família para morar. Zé Benedito comenta que sua esposa teve dificuldades de adaptação no inicio. Havia saído de Itajubá, onde havia passado a maior parte de sua vida e onde morava perto de irmãos e irmãs. Agora, em São José dos Campos, não conhecia ninguém. Tinham três filhos e ele trabalhava no turno da noite, não era fácil. Mas Edna Maria Batista Pinto acabou se adaptando e superou a fase inicial. Conforme seu marido, ela insistia para ele estudar engenharia, porque depois, quando as crianças estivessem mais crescidas, ela queria fazer enfermagem. Só que ele não queria fazer engenharia. Queria fazer metalurgia. Mas não tinha na época, nem materiais. E ele não queria fazer mecânica por fazer. Se for para fazer, vou fazer aquilo que eu gosto, diz. Não fez.
Então quando o filho caçula, que nasceu em São José, estava com seus sete anos, Edna foi fazer faculdade, em Mogi das Cruzes. Estudou na faculdade de enfermagem, curso de quatro anos. Ia e voltava todo dia, de ônibus fretado. Formou-se e começou a trabalhar, na área de maternidade. Como explica Zé Benedito, ela trabalha com o que gosta, com crianças.
Em função dos seus conhecimentos e devido à prática que desenvolveu na sua atividade em tratamento térmico, desde 1992 José Benedito é instrutor no centro de treinamento da Embraer.
De cursos de tratamento térmico, não podia ser diferente. Criou cursos de termometria, pela necessidade de capacitar pessoas quanto aos requisitos da norma aeronáutica AMS 2750. Também é professor na área de tecnologia de materiais metálicos na Escola Politécnica Empreendedor Izidro Muniz, em São José dos Campos.
Agora, quase completando 27 anos de trabalho contínuo em seu departamento de tratamento térmico na Embraer, José Benedito está se aposentando. Como ele diz:
– Quero sair em boas condições, saúde, física, mental. Depois de trabalhar 26 anos e 8 meses na Embraer, é um grande orgulho poder ter trabalhado em uma empresa assim.
Os planos para o futuro de José Bendito Pinto incluem a continuação na atividade de professor e a criação de uma empresa de consultoria, também na área de metalurgia. Entre os objetivos de seu negócio próprio, está o de adequação de equipamentos e processos térmicos, para atendimento ás normas aeronáuticas, entre outras. Aproveitando os três T do diagrama TTT, ele já criou o nome da empresa: TTTérmicos, Técnicas de Tratamentos Térmicos.