A recente polêmica sobre a proibição do uso de saquinhos plásticos para embalar compras foi muito instrutiva. Por um lado, revelou que há um legítimo desejo da sociedade de preservar o planeta. Por outro, mostrou que esse entusiasmo pode ser facilmente manipulado. No final das contas, o lixo doméstico que antes era embrulhado em saquinhos plásticos de supermercado reaproveitados agora é embrulhado em… sacos de lixo feitos exatamente com o mesmo plástico não-degradável, mas agora pagos pelo consumidor. Ou seja, melhorou-se sustentabilidade dos supermercados, enquanto a do planeta ficou exatamente na mesma, senão pior.
Portanto, vale a pena registrar a ação de várias siderúrgicas ao redor do mundo de dar uma real contribuição para resolver o crescente problema dos rejeitos plásticos. Estes são basicamente constituídos de carbono e hidrogênio, insumos básicos para a metalurgia do ferro e aço. Esse fato não passou despercebido por usinas japonesas e alemãs que, há mais de quinze anos, desenvolveram programas para aproveitamento de lixo plástico em convênio com as prefeituras locais. A sucata plástica pós-consumo que não pode ser reaproveitada de outras formas – por exemplo, na produção de novas peças de plástico – é granulada e introduzida em altos-fornos através do mesmo sistema usado para a injeção de finos de carvão. As altas temperaturas reinantes na região das ventaneiras do alto-forno, superiores a 2000°C, desagregam totalmente as cadeias poliméricas, liberando o carbono e hidrogênio que então participam das reações de redução do minério de ferro. Ou seja, não só a sucata plástica é totalmente aproveitada, como há redução no consumo de carvão pulverizado e coque.
A maioria dos plásticos consumidos pode ser processada dessa forma, com exceção do PVC, cuja queima libera ácido clorídrico e dioxinas, uma vez que esse polímero contém cloro em sua molécula. Mas já foram desenvolvidos métodos para contornar esse problema. Os grânulos de PVC são separados por flotação e encaminhados para um reator, onde são carbonizados na ausência de oxigênio. Ocorre então a liberação de ácido clorídrico, o qual é recuperado e vendido. O resíduo carbonoso pode então ser injetado sem problemas no alto-forno.
Outras usinas preferem usar a sucata de plástico na produção de coque. Neste caso o plástico é enfornado nas coquerias junto ao carvão metalúrgico e submetido ao processo convencional de coqueificação. O hidrogênio e outros elementos voláteis presentes no polímero são liberados durante sua destilação e se incorporam ao gás de coqueria, o qual é usado como combustível na usina. O resíduo carbonoso se agrega ao coque e é então usado normalmente no alto-forno. O único inconveniente desta rota de reciclagem é o fato de que só se pode acrescentar 1% em peso de sucata plástica ao carvão para não comprometer a resistência mecânica do coque resultante, uma característica essencial para seu uso nos atuais alto-fornos.
Também foram registradas experiências na Austrália sobre o uso de sucata plástica de polietileno – o mesmo material dos saquinhos de supermercado – como agente carburante em fornos elétricos a arco para a elaboração de aço. Os resultados também foram promissores. Mas foi com a reciclagem de pneus sucatados que este processo mostrou maior sucesso, sendo registrados vários casos de aplicação rotineira em escala industrial em siderúrgicas da França, Bélgica e Estados Unidos. Os pneus são usados para substituir parcialmente os dispendiosos carburantes usados para aquecer a carga metálica do forno elétrico a arco. A vantagem do uso de pneus está no fato de que sua composição química geralmente é bem conhecida, ao contrário da sucata plástica pós-consumo, que é coletada aleatoriamente.
A reciclagem de sucata plástica e de pneus através de processos siderúrgicos já está tecnicamente dominada. O principal problema para viabilizá-la está no fornecimento regular desses rejeitos dentro dos parâmetros de qualidade adequados, uma situação que só é viabilizada através do efetivo cumprimento de leis que proíbam o descarte irresponsável desses rejeitos. Também deve ser devidamente equacionada a remuneração ou compensação das usinas por este serviço, já que elas saem de sua zona de conforto ao usar matérias-primas não-convencionais para contribuir para resolver o problema da crescente geração de lixo doméstico.