Oxidação em temperaturas elevadas

Um estudo de caso envolvendo dispositivos fixadores usados na indústria aeroespacial, feitos das ligas de alumínio 2024 e 7075, no qual danos induzidos por hidrogênio foram encontrados após tratamentos de solubilização e envelhecimento, é um excelente exemplo deste tipo de fenômeno

O efeito do hidrogênio nas ligas de alumínio pode ser observado em um fenômeno conhecido como Oxidação em Temperaturas Elevadas (High-Temperature Oxidation, HTO), também chamado de Deterioração em Temperaturas Elevadas (High-Temperature Deterioration, HTD). Um estudo de caso envolvendo dispositivos fixadores usados na indústria aeroespacial, feitos das ligas de alumínio 2024 e 7075, no qual danos induzidos por hidrogênio foram encontrados após tratamentos de solubilização e envelhecimento, é um excelente exemplo deste tipo de fenômeno. Vamos aprender mais.

Em termos mais simples, a HTO (Fig. 1) é uma forma de difusão do hidrogênio que afeta camadas superficiais de peças durante tratamentos térmicos em altas temperaturas. Isso acontece, frequentemente, por conta da presença indevida de umidade na atmosfera dos fornos e, às vezes, é agravado por contaminações com enxofre ou outros resíduos refratários. Uma das formas mais comuns de manifestação da HTO é a de formação de bolhas de H2 (blisters) na superfície do material (Fig. 2). Este fenômeno também pode se mostrar na forma de vazios superficiais ou de descontinuidades internas. Os sinais da HTO são praticamente idênticos aos encontrados em lingotes que, devido a práticas impróprias de laminação, apresentam altos teores de gases em sua composição. As séries 7xxx de ligas de alumínio, seguidas pelas séries 2xxx, são as mais suscetíveis a esse tipo de problema [2].

Background

Dispositivos fixadores para a indústria aeroespacial estavam sendo fabricados a partir de barras laminadas das ligas de alumínio 2024 e 7075. Após a etapa de tratamento térmico e durante a sua montagem, as extremidades, ou “cabeças”, de vários fixadores encontravam-se fraturadas e separadas do restante do corpo, próximo do nível especificado para torque.

O setor de qualidade da empresa separou essas peças danificadas e as deixou em quarentena. Visualmente, era possível observar pites na superfície. Amostras dos materiais defeituosos foram analisadas nos laboratórios da própria empresa e por laboratórios independentes, a fim de se descobrir a causa raiz da falha.

Os tratamentos térmicos consistiam em aquecer as ligas 2024 e 7075 a 465°C e a 495°C, respectivamente, em forno elétrico com circulação de ar, e manter estas temperaturas por 75 minutos. A uniformidade de temperatura do forno era de ± 5,5°C.

Após o encharcamento nas temperaturas mencionadas, era aberta a porta de um alçapão, posicionado abaixo do cesto de deposição da carga; o cesto, por sua vez, era inclinado e as peças em seu interior, tombadas para fora do cesto e para dentro da calha de transporte. Esta última as levava para o tanque de resfriamento a água encontrado embaixo do forno. Por fim, as peças eram coletadas por um cesto perfurado, localizado abaixo da calha. A água no tanque de resfriamento, antes da imersão da peça recém-saída do forno, era mantida a 32°C por trocadores de calor. Durante o refriamento, a temperatura da água aumentava para 60°C.

A calha de transporte para têmpera continha uma área composta por tela de malha fina, localizada em torno da circunferência e estendida por, mais ou menos, 0,6 m abaixo do nível da água, de forma que o líquido no interior do tanque pudesse se mover livremente pela área da calha. Um tubo com uma série de orifícios projetados para aspergir água através do topo do tanque foi posicionado na linha d’água, com a finalidade de prevenir o vapor de subir e adentrar a câmara de aquecimento do forno, conforme as peças fossem tombadas.

Investigações Feitas no Laboratório

Amostras foram coletadas no campo de trabalho e analisadas de duas maneiras: (I) como recebidas, usando estéreo-microscopia, e (II) após preparação metalográfica para observação nos microscópios ótico e eletrônico de varredura. O corte das amostras foi feito com máquina de corte de precisão e seu preparo metalográfico realizado de acordo com a norma ASTM E3, usando, no embutimento, uma resina condutora adequada para análise em microscópio eletrônico de varredura (MEV).

O MEV era equipado com um espectrômetro de energia dispersiva (EDS). Com o EDS foi possível fazer a avaliação das variações composicionais da superfície do material, usando tanto imagens obtidas por elétrons secundários como por elétrons retroespalhados (Fig. 3). Os resultados dessas análises foram documentados através da aquisição de fotografias digitais, incluindo os resultados de EDS, que correspondiam aos espectrogramas obtidos para cada área superficial estudada. Foram avaliados vários campos de cada amostra, de modo a se ter consistência nos resultados de composição química e de morfologia.

Como resultado final da análise, notou-se que a condição observada nas superfícies das peças defeituosas era de HTO. A presença de porosidade subsuperficial, induzida por HTO, fez com que as peças em quarentena fossem descartadas e, portanto, não mais usadas para produção.

Investigações Feitas no Campo de Trabalho

Com base nos resultados obtidos em laboratório, suspeitou-se de que a presença de vapor d’água na câmara de aquecimento fosse a causa raiz do problema. Se o vapor d’água estava se elevando a partir da calha do tanque de têmpera, ele poderia entrar no forno pelo alçapão e alcançar a câmara de aquecimento. Então, levantou-se a possibilidade da atmosfera de alta umidade ser a fonte de hidrogênio, que penetrou a superfície da peça durante o período de encharque.

Uma inspeção mais detalhada da área do tanque de têmpera revelou dois problemas distintos. Primeiro, o vaporizador localizado na linha d’água do tanque estava bloqueado, limitando a aspersão e, em alguns casos, impedindo que o vapor saísse pelos orifícios. Após desmonte, descobriu-se que os tubos e buracos do sistema de spray encontravam-se total ou parcialmente obstruídos por depósitos minerais e detritos. Um poço de água estava sendo usado para suprir o sistema. Apesar de não ter sido analisado, poços d’água são fontes conhecidas de depósitos minerais.

Segundo, a tela de malha fina usada para permitir o fluxo de água do tanque para a área da calha de transporte estava completamente bloqueada. Isso levou ao aumento de temperatura localizado na área da calha, formando o vapor que, depois, ascendeu ao forno. Todos os componentes do sistema foram limpos e um calendário de manutenção preventiva foi estabelecido. O problema não ocorreu novamente.

Conclusão

Estudos de caso são de valor inestimável e nos oferecem a oportunidade de compartilhar lições práticas aprendidas.

Danos induzidos por hidrogênio em dispositivos fixadores consistem em preocupações da indústria que, muitas vezes, são eliminados por tratamentos de remoção de hidrogênio (aquecimento dos metais na faixa de temperaturas de 175°C a 205°C). Todavia, fenômenos como a oxidação em altas temperaturas enfatizam a necessidade de o tratador térmico estar sempre atento e aplicado durante seu trabalho.

[1] Herring, Daniel H., Atmosphere Heat Treatment, Volumes I and II, BNP Media, 2014 and 2015;
[2] ASM Specialty Handbook: Aluminum and Aluminum Alloys, Joseph R. Davis (Ed.), ASM International, 1993, pp. 298-299;
[3] Dorward , R.C., “Strain-Activated Hydrogen Absorption during Heat Treatment of Al-Zn-Mg-Cu Alloy AA7475,” Oxidation of Metal, Volume 55, Nos. 1/2, 2001;
[4] Marquis, F.D.S., “Mechanisms of Formation of Hydrogen Porosity in 7X50 and 2X24 Aluminum Alloys, Effects on Mechanical Behavior,” Gas Interactions in Nonferrous Metals Processing, D. Saha (Ed,), The Minerals, Metals and Materials Society, 1996;
[5] Lumley, R.N., et. al., “Rapid Heat Treatment of Aluminum High-Pressure Diecastings,” Metallurgical and Materials Transactions A, Volume 40A, July 2009.