Análise de tensões residuais em barras de aço AISI 1045 temperadas por indução

Neste artigo foram avaliadas as tensões residuais em barras cilíndricas de aço AISI 1045 com 20,25 mm de diâmetro após o processo de têmpera por indução. As tensões residuais foram caracterizadas utilizando as técnicas de difração de raios-X e difração de nêutrons

A tendência atual no campo de componentes automotivos críticos é o aumento do desempenho com redução de material e de custos de processamento, por exemplo, usinagem e tratamento térmico. A têmpera por indução de ligas de aço de médio carbono é muito utilizada, principalmente na indústria automobilística. São bem conhecidas algumas vantagens deste processo, podendo destacar o aumento da vida em fadiga, a velocidade do processo e a facilidade em ser executada dentro de uma linha de produção.

Tensões residuais são as tensões elásticas presentes em um corpo sólido sem aplicação de forças externas, incluindo gravidade ou gradientes térmicos. Todo sistema de tensões residuais está em equilíbrio e o somatório das forças resultantes e dos momentos produzidos é zero. O valor máximo em módulo que as tensões residuais poderão chegar é a própria tensão verdadeira de escoamento do material, que por sua vez é função da deformação, taxa de deformação, temperatura e microestrutura [1]

A têmpera por indução dá origem a uma camada superficial com alta dureza e tensões residuais compressivas, devido à expansão da superfície pela formação da fase martensitica. Por outro lado, o núcleo terá tensões residuais trativas. Já foi provado que esta distribuição de tensões residuais aumenta a vida em fadiga, limitando a iniciação de trincas de fadiga. Entretanto a efetividade do aumento da vida em fadiga de um componente temperado por indução depende de sua distribuição e sua relaxação durante serviço. Devido a estes fatores é muito importante o conhecimento do nível e distribuição de tensões residuais.

Material e Métodos

A matéria-prima utilizada neste trabalho é proveniente do processo de trefilação, barras cilíndricas com diâmetro de 20,25 mm de aço AISI 1045. As barras foram temperadas por indução com duas profundidades de camada, sendo elas: 0,63 mm e 1,21 mm.

A Tabela 1 mostra a análise química do material, aço AISI 1045. Na Fig. 1 é mostrada a microestrutura da matéria-prima, barra trefilada de aço AISI 1045, a microestrutura é formada tipicamente de Perlíta, região escura da micrografia, e Ferríta, região clara das micrografias, observa-se também um bandeamento típico de materiais que foram laminados a quente. Na Fig. 2 e Fig. 3 são apresentadas as macrografias após o tratamento térmico de têmpera por indução. Observa-se na Fig. 2 a profundidade de camada temperada, aproximadamente 0,63 mm e na Fig. 3 uma profundidade de 1,21 mm.

Perfis de microdureza foram realizados para determinação da profundidade da camada temperada. Foi utilizada uma carga de 1 kg (HV1) e as identações com avanço de 0,5 mm da superfície até 2 mm, e após a cada 1mm até o núcleo da barra.

A têmpera por indução foi realizada em amostras de 200 mm de comprimento, e foram realizadas duas profundidades de camada, 0,63 mm e 1,21 mm. Os parâmetros do processo são mostrados na Tabela 2.

A caracterização de tensões residuais foi realizada utilizando-se as técnicas de difração de raios-X e difração de nêutrons. Foram avaliados pontos ao longo da superfície da amostra e também em posições periféricas especificas, conforme mostrado na Fig. 4.

Na técnica de difração de raios-X, as barras foram medidas utilizando difratômetro ? (modo de inclinação lateral) equipados com tubos de raios-X de Cr-K? com abertura primária de 1 mm de diâmetro. As linhas de difração {211} do ferro- ? foram registradas para 11 ângulos de inclinação na faixa de 45° < ? < -45°. As tensões residuais foram calculadas usando o método de sin2 ? com E = 210000 MPa e v= 0.28 [2].

O método de medição de tensões residuais por difração de nêutrons é análogo ao método de medição de tensões residuais por difração de raios-X. A determinação das tensões residuais presentes no material por difração de nêutrons segue o principio da lei de Bragg. Este método utiliza o reticulo cristalino do material como um strain-gage interno, baseado na equação de Bragg, Equação 1 [3].

nlambda=2sen0 (equação 1)

Resultados e Discussões

A Fig. 5 mostra os perfis de dureza das amostras temperadas por indução, a dureza para a amostra temperada com 0,63 mm é de 700 HV e decai até a dureza de núcleo 300 HV. Na amostra temperada por indução com camada de 1,21mm a dureza na superfície é de 600 HV e decai para 300 HV com o aumento da profundidade. Observa-se diferenças na dureza para as duas camadas temperadas, estas diferenças estão relacionadas à velocidade de avanço do indutor, parâmetro de tratamento térmico de têmpera por indução.

Tensões Residuais Superficiais Caracterizados por Difração de Raios-X

Na Fig. 6 observa-se a distribuição das tensões residuais superficiais na camada temperada por indução, profundidade de camada de 0,63 mm e 1,21 mm, mediu-se as tensões residuais em três posições periféricas da barra, (0°, 45° e 90°), com uma distância de 2 mm a cada ponto de medição, conforme o procedimento mostrado na Fig. 4.

Analisando-se os valores de tensões residuais para a camada temperada de 0,63 mm observa-se que há diferenças significativas ao longo da amostra e também em relação à posição periférica analisada.

Observa-se que os valores de tensões residuais superficiais para a camada de 1,21 mm apresentam valores mais compressivos comprando-se com os valores medidos para a camada de 0,63 mm. Nota-se que há diferenças significativas no nível de tensões residuais, para uma mesma posição periférica e também ao longo da superfície da barra.

Na Fig. 7 são mostrados perfis de tensões residuais até uma profundidade de 300 µm para a camada temperada de 1,21 mm e duas posições periféricas 0º e 180º. Também são mostrados dois perfis de tensões até uma profundidade de 200 µm para a amostra com camada temperada de 0,63 mm. Observa-se que os níveis de tensões residuais superficiais para a camada de 1,21 mm apresenta valores mais compressivos comprando-se com os valores medidos para a camada de 0,63 mm. Nota-se que há diferenças significativas no nível de tensões residuais, para as duas posições periféricas analisadas, independente da condição de têmpera, mas estas diferenças são menores dos que as apresentadas na superfície da barra. Analisando-se camadas mais profundas, as diferenças de tensões residuais, em relação à posição periférica, são mantidas comparando-se as duas condições de têmpera por indução.

Tensões Residuais Superficiais Caracterizados por Difração de Nêutrons

Na Fig. 8 são mostrados os perfis de tensões residuais longitudinais, transversais e radiais, caracterizado por difração de nêutrons, para a barra temperada por indução, a camada temperada foi de 0,63 mm. Observa-se o nível de tensões residuais longitudinais e transversais fortemente compressivos na superfície, este comportamento já foi caracterizado por outros autores [5]. Observa-se que após o final da camada temperada há uma inversão de tensões residuais tornando o comportamento trativo, aproximadamente 450 MPa e este comportamento volta a ser compressivo no núcleo do material. No primeiro estágio de têmpera por indução observa-se o ciclo de aquecimento da peça cilíndrica, a seção do cilindro que está sendo aquecida pela bobina sofre uma dilatação térmica tentando a expansão, mas a temperatura do cilindro ainda é baixa neste estágio, menor que 500 ºC. Durante este estágio, o aço ainda não apresenta uma condição de fácil expansão, como resultado, tensões são geradas no cilindro. O aumento de temperatura irá causar um aumento de tensões compressivas na superfície, na faixa de temperatura entre 520 ºC e 750 ºC, assim o aço sofrerá uma expansão plástica volumétrica e haverá redução das tensões. Quando a temperatura excede os 850 ºC, a superfície do cilindro irá expandir, e o diâmetro da parte aquecida irá aumentar em relação ao diâmetro inicial. Isto é devido ao fato de o limite de escoamento na superfície ser consideravelmente menor, assim o material irá escoar plasticamente, como consequência, as tensões na superfície irão diminuir significantemente [5]. Após o fluido de resfriamento ser pulverizado na superfície, se este resfriamento for eficiente irá causar a formação de martensita na superfície. A formação da martensita causa uma expansão volumétrica em relação ao núcleo do material, formando tensões residuais compressivas na superfície, para camadas mais profundas há uma complexa formação de tensões variando de compressivas a trativas formando um equilíbrio entre elas.

• Como esperado a têmpera por indução induz tensões residuais compressivas significativamente elevadas na superfície da barra temperada;• Na interface entre regiões temperadas superficialmente e não temperadas ocorre um pico de tensões trativas que, no caso de têmpera superficial para uma profundidade de 1,21 mm, atingiu valores da ordem de 350 MPa. Isto sugere que um cuidado especial deve ser tomado, visando a cobertura completa do comprimento da haste pela camada temperada;• Há diferenças significativas de tensões residuais ao longo das amostras analisadas e também nas diversas posições periféricas analisadas;• A velocidade de avanço da barra em relação ao indutor tem forte influência nas tensões residuais, camada temperada e dureza de camada.

Agradecimentos

Este trabalho é parte dos resultados da Iniciativa Brasil-Alemanha para Pesquisa Colaborativa em Tecnologia de Manufatura – BRAGECRIM. Os autores agradecem a CAPES, FINEP, CNPq e DFG pelo suporte financeiro para a realização deste projeto. Os autores também agradecem o Helmholtz-Zentrum Berlin pela disponibilização do difratômetro E3, sob responsabilidade do Dr. Robert Wimpory, para medição de tensões residuais por difração de nêutrons.

Referências

1. LU, J.; SOCIETY FOR EXPERIMENTAL MECHANICS U.S. Handbook of Measurement of residual Stresses. Lilburn, GA Upper Saddle River, NJ: Fairmont Press; Distributed by Prentice Hall PTR, 1996. xv, 238 p.;
2. HAUK, V.; BEHNKEN, H. Structural and Residual Stress Analysis by Nondestructive Methods : Evaluation, Application, Assessment. Amsterdam; New York: Elsevier, 1997. xiv, 640 p.;
3. WITHERS, P. J.; BHADESHIA, H. K. D. H. Overview – Residual Stress Part 1 – Measurement Techniques. Materials Science and Technology, v. 17, n. 4, p. 355-365, Apr 2001;
4. HUTCHINGS, M. T. Introduction to the Characterization of Residual Stress by Neutron Diffraction. Boca Raton, FL: Taylor & Francis, 2005. 401;
5. RUDNEV, V. Handbook of Induction Heating. New York: Marcel Dekker, 2003. xi, 777 p.

Para mais informações, contate: Rafael Menezes Nunes, Doutorando do Laboratório de Transformação Mecânica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tel. (51) 3308-9921, email: rafael.nunes@ufrgs.br; Alexandre da Silva Rocha, Prof. Dr. Eng. do PPGEM – UFRGS e pesquisador do Laboratório de Transformação Mecânica, da Escola de Engenharia da UFRGS, email alexandre.rocha@ufrgs.br; Thomas Hirsch, Priv Doz. Dr. Ing., IWT – Stiftung Institut für Werkstofftechnik, Bremen, Alemanha, email hirsch@iwt-bremen.de.