Fundidos, forjados ou sinterizados?

Em tempos em que o mercado está aquecido e a produção impulsionada, poucos pensam em inovar e desenvolver novos produtos para não atrapalhar o foco no produto corrente e já consolidado. Porém, quando as empresas se tornam ociosas, que é o momento de acelarar os investimentos em inovação, porque quando a economia for retomada, essas empresas estarão prontas para se beneficiar da situação de mercado.

Mas enquanto tudo isto é um cenário lógico, não é uma realidade posta em prática. O que temos visto é uma crise generalizada, com a perda de capacidade de investir para os desafios de um futuro próximo. Por isso, eu gostaria de expor aos leitores a situação de concorrência entre as tecnologias no sentido de se pocisionar no mercado de produtos automotivos, e começo comparando fundidos, forjados e sinterizados, campos que sempre estiveram concorrendo entre si.

Os produtos fundidos foram os que mais sentiram as consequências da crise e impactaram diretamente nos produtores locais, com fechamento de empresas e o sucateamento de linhas de produção e isto refletiu também, como observado, a redução de participantes na última edição da FENAF 2017[1]. O setor de forjados deixou de produzir peças na proporção da queda no volume de produção de veículos e, ainda, as aciarias deixaram de lingotar as matérias-primas e partiram para fechar plantas ociosas. Por fim, a área de Metalurgia dos Pós, mesmo com queda de demanda, foi a que, na média, menos sentiu e impactou suas unidades produtivas diante das novas tecnologias recém-chegadas aos nossos motores veículares, que compensaram em volume este momento difícil.

Indo a fundo na questão, a grande força dos forjadores vem das usinas de aço, que conseguem se manter vivas em momentos difíceis e certamente estarão empurrando o segmento destes produtos na retomada do mercado, como já temos presenciado, recentemente, o retorno de operação de grandes usinas lingotadoras de aço. Todavia, caso diferente ocorre para os fundidos, que dependem apenas de seus produtos e capacidade instalada. Sem suporte e apoio de base, tem resultado em um enorme endividamento do setor que, sem dúvida, dificultará muito o seu reposicionamento. Já no caso de sinterizadores, apesar da queda do volume também acompanhar o cenário automotivo, as usinas e sistemistas estão bem alinhados e participativos na situação do mercado, como por exemplo as novas gerações de motores e futuras transmissões que estão sendo alavancadoras do setor, sem considerar os sistemas de eletrificação que começam a privilegiar estes materiais.

Para agravar a situação, o endividamento generalizado das empresas leva os departamentos comerciais das montadoras a restringirem os novos negócios e, consequentemente, dificultando em se estabelecer novamente como um player competitivo. Mas diante de tudo isso, como as empresas poderão reverter esta questão e retomar o sucesso em um segmento altamente competitivo?

As montadoras procuram redução de custo, leveza nos materiais sem comprometer o desempenho do produto e, por isso, mesmo com o mercado estando em baixa, o Programa Brasileiro Inovar-Auto[2] e a Rota 2030[3] estiveram e estarão ditando as regras do mercado automotivo, indiferentemente, diante da crise produtiva. Por isso, enquanto estas empresas têm tentado sobreviver diante das reduções de volume, algumas poucas estão se beneficiando com novos produtos, tecnologia e inovação, e esta nova fase deste programa, que estará sendo oficializado ao final deste ano, dará força aos investimentos em P&D&I e aproximará mais os institutos e universidades ao segmento automotivo, desde que as empresas encontrem o “caminho das pedras” para geração destas iniciativas. Um exemplo: a pergunta que mais tenho feito em meus fóruns é “qual foi a última vez que vocês visitaram a engenharia de uma montadora para propor um novo produto ou uma rota de fabricação?”. A reposta é entristecedora.

Enfim, diante de todo este cenário, o mais difícil é saber como estes três segmentos vão se posicionar na era das tecnologias inovadoras, com os avanços dos produtos de compostos e os vindos da manufatura aditiva, com capacidade de produção e rapidez cada vez maior e um crescimento impressionante. Pergunta similar e inversa feita para as grandes montadoras sempre tem a mesma resposta, ou seja, manter o foco no produto atual e participar ou acompanhar em paralelo as novas tecnologias, para que ocorra uma suave transição ao longo de anos. Portanto, enfatizo que o desespero não deve bater de imediato, porque ainda teremos tempo para levar os produtos atuais por um bom período, até mesmo décadas, dedicando esforços ao nosso “arroz com feijão”, e ao mesmo tempo acompanhar esta onda tecnológica que vem chegando.

Creio que o carro do futuro ainda terá produtos forjados, fundidos e sinterizados compartilhando espaços com as novas tecnologias, porém em um cenário de demanda muito alta, isto é, a perda de market share será expressiva. Mas o aumento de demanda manterá fortes os negócios, e ainda por final, existirá um aumento relativo na produção destes segmentos, continuando a forma competitiva atual.

A necessidade de compartilhamento tecnológico entre empresas, sistemistas e universidades tem se tornado a grande onda destes novos tempos, com o crescente cooperativismo entre empresas e centros de P&D, visivelmente incentivados pelos orgãos do governo e associações e também, pela presença oportunista de novas empresas privadas facilitadoras deste processo. Não será possível sobreviver estando isolado em seu negócio sem mudar a forma de atuação e estar mais participativo dos fóruns e das necessidades dos clientes. A imagem da realidade futura que temos nos conduz a dizer que tudo que estamos ouvindo sobre o futuro está sendo diariamente revisado e podemos apostar em uma mudança muito mais rápida do que a prevista. Um grande abraço e até a próxima edição da IH.

 

Referência

[1] http://www.abifa.org.br/conaf/;
[2] http://www.theicct.org/sites/default/files/publications/ICCTupdate_Brazil_InovarAuto_feb2013.pdf;
[3] http://www.mdic.gov.br/index.php/noticias/2768-em-evento-na-toyota-igor-calvet-explica-que-nova-politica-favorece-investimentos-no-setor-automotivo.