Caros leitores, nesta edição gostaria de compartilhar com vocês o mundo espetacular da nanotecnologia, que trata de uma ciência em fase de crescimento, mas que deve fazer grandes mudanças no setor automotivo. Mas já de saída enfatizo que ela está mais para um sonho do que uma realidade e é neste sentido que gostaria de compartilhar com vocês o motivo deste sentimento e, ao fim, tentarmos entender a situação que estamos vivenciando.
Primeiramente, relato que os avanços dentro dos laboratórios globais, e também aqui no Brasil, têm nos mostrado grandes ganhos, e isto percebi no último evento SISNano (Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologia[1]) ocorrido em Campinas (SP), no CNPEM, recentemente em Junho. Estive diante de tantos laboratórios altamente capacitados e na presença de um número expressivos de pesquisadores de ponta. Ainda que os nano produtos criados sejam inovações totalmente admiradas pelo seu grau de ineditismo, mas, às vezes incompreensíveis para nossa realidade, parece-nos que estamos vivendo em um outro universo completo de novas ciências e alquimias. Ao fim, não conseguimos viabilizar sua aplicação, esbarrando no desafio de transportar estas tecnologias para as linhas de produção de veículos de forma barata e eficiente.
Lembro que o grande momento em que a nanotecnologia passou a ser referenciada em nosso meio foi principalmente quando criou-se o grafeno e, na sequência, os nanotubos. Isto é, soube-se dar uma nova configuração para aquilo que já estava presente em nosso meio, nos tradicionais grafites que usamos em nosso dia a dia, e neste momento abriu-se uma porta para ter em mãos um material de elevada resistência mecânica, altíssimas condutividades térmica e elétrica e, por fim, uma extrema leveza. Mas o grande desafio está nos custos, nas rotas de produção destes produtos, impeditiva para o setor automotivo. Anterior à era do grafeno e considerando que qualquer material na ordem de grandeza de nanômetros pode ser referenciado a esta técnica, cito as nanoargilas utilizadas como aditivos em plásticos, que já são conhecidas deste a década passada, utilizadas em painéis, consoles e em plásticos protetivos e ou decorativos, que teve sua aplicação ocorrida em alguns veículos de linhas, mas por pouco tempo, não se mantendo no mercado devido ao seu custo elevado de manufatura.
O maior desafio da nanotecnologia está em sair de uma escala de laboratório e entrar em uma manufatura ou fábrica de produtos automotivos, e por isto desafiamos estes grandes centros de P&D e os empreendedores. Hoje, sabe-se que empregamos conceitos de nano tamanhos em produtos já conhecidos, mas que não eram vistos desta forma, citando o arranjo das microestruturas encontradas em aços, como precipitados e interfaces de fases intermetálicas, todas atuantes fortemente nas propriedades em proporção aos seus tamanhos e também na sua forma, como por exemplo a deposição de cristais em superfície de chapas de aços para melhoria de estampabilidade.
Atualmente, os principais produtos de nanotecnologia para o setor automotivo direcionam mais para as condições de superfícies pintadas e envidraçadas, como os nano repelentes de sujeiras e partículas, mantendo a superfície limpa e/ou de fácil limpeza quando aplicados posteriormente a pinturas e outros produtos adicionados às tintas, podendo carregar nanocápsulas que conduzem qualquer produto de interesse, como cicatrizantes e regenerativos, que são liberados em eventos ocorridos durante a vida útil do componente. Portanto, os principais interesses na área de P&D em nanotecnologia estão associados a revestimentos, desde questões de processamento até melhorias de propriedades superficiais, resistência a corrosão, barreira contra sujeira e outras mais específicas, como condutividade elétrica e redução do coeficiente de atrito. Na esperança de nos beneficiarmos destes materiais, devemos olhar para um futuro próximo, com a presença maciça dos veículos elétricos e autônomos que terão uma grande preferência por este campo para solucionar problemas de autonomia, baterias e conexão e, isto sim, será uma grande oportunidade para os nanomateriais e demandarão grandes investimentos em P&D.
Para tratarmos a nanotecnologia com respeito dentro de nosso meio, precisamos compreender que ela não deixará os veículos mais baratos, mas sim trará novos benefícios aos nossos produtos, portanto, é necessário mudar a nossa forma de percepção em relação a esta questão, no sentido de dispor de maiores valores por algo melhor e isto será exatamente a interface de popularização desta ciência/tecnologia. Ainda que agregando tantas perguntas, dúvidas, desconhecimentos e inovações, relato a vocês que a frase que melhor ilustra nosso sentimento é a admiração em um primeiro momento, seguido de abandono por não acreditar nesta realidade, e é isto que observo nesses anos que tenho lidado com este tema dentro do setor automovido e acredito que isto deve se manter por algum tempo até que se quebre a barreira entre a pesquisa e a aplicação do produto de forma eficaz.
Referência
[1] http://www.mcti.gov.br/sisnano.