Recentes acidentes levaram a Associação Norte-Americana de Proteção contra Incêndios (NFPA) a adotar uma série de alterações na norma NFPA 54 (relativa a manuseio de gás natural)
Estimulados pelas recentes explosões na estação de força da Kleen Energy que estava sendo construída em Middletown – Connecticut – e na usina ConAngra em Garner – Carolina do Norte, a National Fire Protection Association (NFPA) adotou mais de 40 mudanças no código nacional de gás combustível norte-americano (National Fuel Gas Code – NFPA 54). As mudanças fornecem novos procedimentos para a purga das linhas de gás, processo que provocou inúmeras explosões, lesões e até mortes nos anos recentes, incluindo 6 mortes e milhões de dólares gastos com os danos da Kleen Energy, em fevereiro passado (Figura 1).
É a hora de os profissionais de gestão de riscos e de segurança entenderem melhor o projeto e as exigências de segurança da operação de purgar tubulações de gás natural. Muitos não têm ideia de que as regras mudaram recentemente, proibindo a liberação de linhas de gás natural dentro de prédios quando os mesmos estão em construção ou manutenção. De acordo com a NFPA, as novas exigências foram projetadas para exigir que a purga seja feita do lado de fora de qualquer prédio industrial e de grandes prédios comerciais ou residenciais.
Outras mudanças nas normas proíbem que a purga das linhas de gás seja feita utilizando gás natural – uma prática comum nas empresas – e muda a forma na qual os eventos da purga devem ser monitorados no local. A lista completa com as mudanças pode ser encontrada em nfpa.org.
Mal-Entendido Leva ao Desastre
Se você estiver planejando adquirir um equipamento, comissioná-lo em serviço ou mesmo construir uma planta, seja nos EUA ou em outro país, isto é algo no qual você deveria prestar atenção. O U.S. Chemical Safety Board relata que o processo de purga está associado a pelo menos sete grandes explosões desde 1997, as quais provocaram a morte de dezenas e feriram centenas.
Sempre que uma linha de gás é instalada, aumentada ou reparada, ela precisa ser purgada para remover misturas explosivas de ar e combustível. Se o gás natural for enviado para um tubo contendo ar, isto poderá criar um local no qual o tubo tenha uma mistura inflamável. Se esta mistura se mover na direção de um queimador ou de uma fonte de ignição, você essencialmente criou uma bomba no tubo.
A purga não pode ser confundida com ventilação. O termo ventilação é utilizado para descrever a liberação do gás quando uma seção do tubo é aberta e o gás é então liberado para o ambiente. Isto deve ocorrer abrindo-se a flange, uma união ou o vento de purga. A purga é diferente. Ela envolve o uso de um meio inerte, como o nitrogênio, para puxar o gás para fora do tubo até o seu final. Há diferentes tipos de purgas que dependem da taxa do fluxo e da velocidade do meio de purga.
O projeto da tubulação do gás, a operação e os procedimentos de segurança requerem um especialista com alto nível alto de expertise. Aqueles responsáveis pela gestão dos riscos precisam se assegurar de que todos na organização conheçam as regras e entendam o que precisa ser feito para proteger as instalações. Engenheiros e projetistas precisam estar totalmente treinados com as exigências do código e com os projetos práticos para a tubulação de gás natural. Os contratantes devem estar especialmente cientes das exigências de segurança e das necessidades de treinamento dos trabalhadores quando da realização da purga em tubulações de gás natural.
Pouquíssimos entendem as exigências atuais. É pouco provável que mesmo a seguradora da sua empresa entenda completamente para poder direcioná-lo. Assunto agravado pela recente explosão de um gasoduto em San Bruno, na Califórnia, muitas empresas e suas seguradoras já não estão dispostas a assumir a responsabilidade para purgar as linhas de gás, sem que tenham o apoio de um profissional terceirizado.
Os acontecimentos recentes ilustram graficamente os riscos inerentes de uma tubulação de gás natural mal projetada, comissionada de forma mal planejada e casual. Além do risco óbvio de morte e lesões, explosões na escala do desastre da Kleen Energy podem causar danos extremos à propriedade no valor de centenas de milhões de dólares, causando perda significativa no tempo de produção e prejudicando de forma irreversível a reputação da empresa.
Planejando uma Purga Segura
Em nossa experiência, verificamos que muitos projetistas, engenheiros, contratantes e trabalhadores da manutenção não entendem que os reparos em uma tubulação de gás natural são bem diferentes das tubulações de fluídos ou ar, as quais são bem mais familiares. Além disto, as tubulações de gás requerem conhecimentos e treinamentos especiais. Há, frequentemente, uma grande e perigosa falta de conhecimento entre aqueles que rotineiramente gerenciam ou fazem os reparos nas tubulações de gás (Figura 2). Entretanto, se um bom plano for preparado pelos engenheiros experts e as corretas precauções forem tomadas pelos contratantes, você conseguirá ter um projeto livre de incidentes.
Considere esta pequena lista de tarefas que são importantes e questões-chave ao fazer o planejamento do reparo de uma tubulação de gás:
– Há um plano de purga escrito (pré-reparo e pós-reparo) que identifique todas as pressões de teste necessárias e as normas que devem acompanhá-lo? Todos na equipe entendem o plano e o que cada um deve fazer na execução?;
– Há um plano preparado de reintrodução do gás? A reintrodução e o start-up foram discutidos com a equipe, incluindo quaisquer riscos?;
– Os serviços de emergência ou bombeiros locais foram envolvidos no planejamento? Há equipamentos para controle do fogo localizados próximo, para uso dos trabalhadores?;
– O projeto da tubulação de gás foi revisto considerando-se possíveis problemas mecânicos, incluindo os materiais das tubulações, as válvulas e os acessórios selecionados, os pontos de purga e os isolamentos? Onde estão os pontos de isolamento, e como o isolamento será feito com segurança?;
– Há um isolamento do gás natural e um plano de bloqueio do equipamento? Há um plano para a limpeza das linhas e para retestar as válvulas automáticas antes que o processo seja reiniciado? Verifique se todas as válvulas especiais de fechamento estão em funcionamento. Verifique se toda a tubulação está devidamente marcada;
– O equipamento de gás está (ou deveria estar) envolvido no processo de purga? Há quaisquer requisitos especiais para os mesmos?;
– Você já determinou a quantidade de nitrogênio necessário para a purga, checou as fugas e verificou como o nitrogênio será introduzido na tubulação? Será que todos entendem os riscos de se trabalhar com o nitrogênio? Realize, como parte do processo de planejamento, treinamentos de segurança no uso de nitrogênio;
– Para onde a purga será direcionada? Qual a direção dos ventos? Há ventaneiras ou exaustores de ar próximos? Se for ocorrer uma purga de tubulações de alta pressão ou a liberação de pressão, a modelagem de uma pluma pode ser útil;
– Todos os serviços elétricos estão seguros na área da purga de gás e onde a ventilação do gás natural irá ocorrer? Uma explosão só pode ocorrer quando uma fonte de ignição está próxima;
– Não deve haver nenhum trabalhador, exceto aqueles que irão fazer a purga, no local onde a purga do gás irá ocorrer. Não deve ser permitida a presença de expectadores;
– Documente todos os resultados dos testes de pressão (ou seja, as pressões dos testes e por quanto tempo elas foram mantidas).
Quais Códigos e Regras se Aplicam?
Há diversos códigos que podem ter alguma aplicação no reparo de uma tubulação de gás natural. Como já discutimos, o principal código que se aplica à tubulação de gás natural é o NFPA 54: O Código Nacional de Gás Combustível norte-americano. As regras são bastante longas, e é necessário tempo e esforço para compreender completamente a intenção e as exigências do código e as mudanças recentes. Muitas vezes nos deparamos com empresas de consultoria em engenharia e empreiteiras que não entendem as exigências básicas do código. O resultado desta falta de conhecimento muitas vezes aparece em um projeto de planta que não possui pontos de isolamento e / ou pontos de purga. Parece ser dada pouca atenção aos requisitos da NFPA na instalação da tubulação de gás ou em como a linha de gás será comissionada ou inspecionada após a instalação ou mesmo reparada no futuro.
Outro código importante a ser considerado é o OSHA 1910.147 para bloqueio / etiquetagem de fontes de energia perigosas. Muito tem sido escrito sobre esses requisitos e a maioria dos trabalhadores fez alguma tentativa de cumpri-lo – pelo menos para dispositivos elétricos. No entanto, os requisitos da OSHA abrangem também os sistemas de outros tipos de plantas, tais como gás natural e tubulações a vapor. Por exemplo, muitas vezes encontramos um bloqueio em desconexões elétricas, mas raramente em uma válvula de gás fechada (Fig. 3).
Mesmo quando os trabalhadores se atentam ao isolamento do equipamento de forma correta, uma área que muitas vezes é esquecida é a válvula macho lubrificada utilizada nas linhas de gás. As válvulas macho lubrificadas, que representam 60-80% dos sistemas de fechamento manuais das tubulações de gás natural, têm um pequeno vazio entre o plugue e o corpo da válvula. Se um selante não for aplicado anualmente, como exigido pelo código e pelo fabricante, o gás vazará pelo plugue, mesmo quando a válvula estiver na posição fechada. Descobrimos que a maioria das empresas não tem o conhecimento necessário ou o equipamento para selá-los, e a selagem nunca foi realizada durante a vida da válvula. Desta forma, o fechamento ou bloqueio de uma válvula em condições não adequadas não irá isolar a fonte de energia. A questão mais grave é que se a selagem não for realizada regularmente pode se tornar impossível o fechamento da válvula. Isto significa que não será possível cortar o fornecimento de gás no caso de uma emergência.
Controlando os Riscos
Por fim, quem é o responsável pela tubulação de gás natural e pela segurança durante a purga? Os engenheiros de projeto podem preparar os desenhos considerando os códigos e as normas aplicáveis, mas, pode ser que nunca visitem o local do projeto. O gerente do projeto deve garantir que o projeto atenda a estas normas e códigos, mas, geralmente, está consumido com cronogramas e orçamentos. Os empreiteiros estão focados em atender às especificações do projeto, manter o cronograma e terem lucro. O diretor de segurança do projeto, em geral, está preocupado com bloqueios, perigos de viagem, escorregões e quedas, amarrações e outros problemas mais comuns. A maioria dos inspetores locais não entende os detalhes intrínsecos ao comissionamento da tubulação de gás, porque não há quaisquer regulamentações locais às quais o projeto deva obedecer.
Quando a responsabilidade pela segurança da purga de uma tubulação de gás é responsabilidade de todos, então, não há nenhum responsável. Pessoas muito experientes estavam realizando o trabalho nos desastres mais recentes. Mas no calor da batalha, muitas coisas podem e são esquecidas. Existem inúmeras tensões diárias e pressões em um canteiro de obras. É por isso que o planejamento adequado e o compromisso com a segurança vindo de cima para baixo é necessário para fornecer uma disciplina focada que pode fazer a diferença entre o sucesso e o fracasso.
Para mais informações, contate: John R. Puskar, P.E., Dirigente da CEC Combustion Safety, Ohio, EUA, tel: +1 216-826-3473; e-mail: jpuskar@combustionsafety.com; web: www.combustionsafety.com. Ele atua como substituto nas comissões da NFPA 86 e CSD-1 ASME.