O Doutor em Tratamento Térmico é perguntado com frequência sobre o revenimento, desde coisas fundamentais, tais como: “Ele é necessário?”, até coisas um pouco mais complicadas, como: “Quais são as regras quando se faz um rerrevenimento das peças?”. Outras questões frequentes incluem “Quanto tempo eu tenho após a têmpera e antes do revenimento?” ou “Quantos revenimentos eu deveria fazer?”. Todas estas questões são importantes e todo tratador térmico tem que saber as respostas. Vamos aprender mais.
O Que é o Revenimento?
Enquanto a aplicação final de um componente determina o seu tratamento térmico, nós, como tratadores térmicos, estamos constantemente nos esforçando para atingir o balanço delicado entre as propriedades de resistência e dutilidade.
Em nenhum outro lugar esta linha fina é mais evidente do que no processo de revenimento de um dado aço, no qual um controle preciso do tempo, da temperatura e (em alguns casos) da taxa de resfriamento é crítico.
Essencialmente, o revenimento (Fig.1) é a modificação da recém-formada microestrutura endurecida em direção ao seu equilíbrio. Por esta razão (se não houver outras), o revenimento deveria ser realizado sempre.
Quase todos os aços que são submetidos a qualquer tipo de processo de endurecimento são revenidos – submetidos a um tratamento subcrítico que altera sua microestrutura e propriedades (Fig.2). De uma forma geral, o revenimento diminui a resistência mecânica e a dureza ao mesmo tempo em que melhora a dutilidade e a tenacidade da martensita como temperada [3].
As ligas endurecíveis por precipitação, incluindo muitas classes de alumínio e superligas, são revenidas para que precipite partículas intermetálicas, aumentando a resistência do metal. Os aços ferramenta e os aços rápidos são, em geral, submetidos a múltiplos revenimentos para atingir as propriedades de dureza ao mesmo tempo em que transforma a austenita retida primeiro para martensita não-temperada e, nos revenimentos subsequentes, a mesma é transformada em martensita revenida.
Revenimento de Alívio de Tensões (ou de Segurança)
O revenimento em baixas temperaturas, na faixa de 135 a 150°C, antes da condução de uma operação de revenimento padrão, é muitas vezes referido na indústria de tratamento térmico como revenimento de “alívio de tensões” ou de “segurança”. Ele também é conhecido fora do chão de fábrica como “levando a maldição pra fora” do material. É uma etapa adicionada à sequência do processo quando o tempo entre as operações de têmpera e revenimento não será maior que 1 ou 2 horas ou não será maior que 15 a 30 minutos para aços de alta temperabilidade. Um revenimento de alívio de tensões deveria sempre ser realizado em temperaturas mais baixas do que o revenimento final. O revenimento de alívio de tensões também é comumente realizado antes da operação inicial de resfriamento profundo para minimizar as tensões, anular efeitos de geometria e evitar trincas.
Rerrevenimento
O rerrevenimento é uma operação realizada nas indústrias de tratamento térmico, o qual, em geral, é adicionado à sequência de processos por uma das diversas razões a seguir. Uma das razões mais comuns para o rerrevenimento é que o produto na condição temperado e revenido excede a dureza objetivada (ou faixa) e apresenta ao mesmo tempo baixa dutilidade e/ou tenacidade. Esta pode ser uma ocorrência, de alguma forma, comum, especialmente na história inicial de fabricação de um componente, até que um conjunto de dados empíricos possa ser estabelecido baseado em muitos ciclos e aquecimentos do material. Muitos fabricantes diriam “melhor rerrevenir do que retemperar”. Ninguém quer repetir múltiplas operações se um simples rerrevenimento irá resolver o problema. Se os resultados iniciais estiverem fora da faixa desejada ou muito longe dos valores objetivados, os parâmetros para um rerrevenimento podem ser prontamente determinados.
O rerrevenimento é realizado ao longo de uma ampla variedade de temperaturas e tempos relacionada com a operação de revenimento original, dependendo da série de materiais e fatores de processo. Como notado previamente, o revenimento é um processo dependente de tempo e temperatura e um revenimento adicional (ou múltiplos revenimentos) exalta os efeitos da operação de revenimento original.
As equações de Hollomon-Jaffe e/ou Larson-Miller, as quais compreendem tempo, temperatura e parâmetros de revenimento, são amplamente utilizadas e têm sido refinadas ao longo dos anos [6]. Essas equações são extremamente úteis e podem auxiliar o tratador térmico a fazer estimativas dos efeitos do revenimento original e dos efeitos cumulativos de qualquer revenimento subsequente nas propriedades de muitos materiais diferentes (por exemplo, resistência mecânica, dureza, dutilidade, tenacidade e detalhes de microconstituintes). Isso é crucial para assegurar que a operação de rerrevenimento não fornecerá somente os efeitos corretivos desejados na propriedade de interesse, mas, também, não irá criar qualquer efeito prejudicial previsto ou não previsto.
Deve ser tomado cuidado para que o rerrevenimento não alcance a temperatura de revenimento dentro da zona de fragilização da martensita revenida (TME – Temper Martensite Embrittlement). Isso não somente fragilizaria o aço, mas – como a TME é um fenômeno irreversível – os componentes teriam que ser retemperados. Isso tem potencial para criar muitos problemas adicionais e é um processamento no qual é fácil cair em armadilhas. Ao mesmo tempo em que a dureza e a resistência poderiam ser prontamente ajustadas para o nível desejado, a tenacidade poderia ser comprometida de forma significativa.
Uma segunda razão para o rerrevenimento é recuperar a resistência ao escoamento em tração quando um produto é deformado de forma compressiva durante a sua fabricação. A deformação por compressão durante os processos de conformação a frio, trefilação a frio ou estiramento a frio pode causar o Efeito Bauschinger, o qual resulta de efeitos de endurecimento por deformação.
O resultado é que quando um material temperado e revenido é deformado sob compressão, o limite de escoamento em tração diminui. Felizmente, o fenômeno é reversível e, geralmente, pode ser solucionado por meio de uma operação de rerrevenimento. Tal rerrevenimento é, geralmente, conduzido em temperaturas entre 28 e 56°C, ou mais, abaixo da temperatura de revenimento inicial. Isto é feito para preservar a resistência à tração e a dureza ao mesmo tempo em que recupera o limite de escoamento em tração pela eliminação dos efeitos de direcionalidade do endurecimento por deformação.
A prudência deve ser exercitada quando se processa aços temperados e revenidos sujeitos à fragilidade ao revenido (TE – Temper Embrittlement). Um aço suscetível à TE, quando revenido inicialmente a 590°C, trabalhado a frio e, então, revenido para alívio de tensões a 540°C poderia ser impactado de forma prejudicial.
De forma similar, é preciso estar atento quando o rerrevenimento é conduzido na faixa em que o endurecimento secundário pode ocorrer nos aços mais altamente ligados ou em materiais endurecíveis por precipitação, em vários sistemas de ligas.
Uma revisão de engenharia das características de revenido de uma peça de qualquer material deveria sempre ser conduzida e projetada com planos apropriados de tratamento térmico. Isso é especialmente verdadeiro para situações nas quais a quantidade de elementos de liga pode resultar no “quarto estágio do revenimento”[4] e fornecer efeitos significativos nas propriedades resultantes.
A questão que naturalmente é levantada é sobre a aceitabilidade do rerrevenimento em uma dada operação. É necessário entender a extensão na qual o rerrevenimento será considerado uma operação de retrabalho/reprocessamento. É importante estabelecer os protocolos adequados para recomendar as partes específicas de um rerrevenimento quando o mesmo é conduzido.
É necessário estar atento às especificações governamentais para o produto e as operações que se tem à mão, aquelas do fabricante e do consumidor. É uma boa prática ter esses protocolos pré-determinados.
Um exemplo excelente é fornecido pela AIAG (Automotive Industry Action Group – associação global do setor automotivo que se concentra em implementar diretrizes para processos de negócio, educação e formação de profissionais) na especificação atual CQI-9 [7] (conjunto de normas que tem como principal objetivo fornecer diretrizes para a avaliação do sistema de tratamento térmico), a qual afirma o seguinte em relação ao processamento de tratamento térmico e de rerrevenimento. “Questão: O consumidor OEM (Original Equipment Manufacturer – Fabricante Original do Equipamento) é pra ser notificado quando peças são reprocessadas?” Exigências e Orientações (lista parcial, parafraseada):
• O OEM precisa ser notificado quando peças são reprocessadas;
• É preferível uma notificação baseada em caso por caso;
• Alguns reprocessamentos (tal como, mas não limitado a, operações de rerrevenimento) devem ser pré-aprovados.
Para ser pré-aprovado, o tratador térmico:
• Deve submeter um procedimento de reprocessamento para aprovação pelo OEM;
• O procedimento deve descrever características do processo para as quais o reprocessamento é permitido e para aquelas nas quais não é;
• Qualquer atividade de reprocessamento necessita de uma nova folha de controle do processo, a qual denota as modificações necessárias no tratamento térmico;
• Registros devem mostrar quando e como o material foi reprocessado.
O rerrevenimento pode ser, e frequentemente é, um processo aplicado de forma comum em operações de tratamento térmico para produtos finais e intermediários para um grande número de empresas e vários sistemas de ligas.
O tratador térmico deve saber e entender as propriedades metalúrgicas e características do processamento térmico do material da sua peça se o rerrevenimento for aplicado.
Conclusão
Quando se fala de revenimento, parece haver uma resistência à realização de múltiplos revenimentos simplesmente pelo fato de haver um aumento no tempo envolvido para liberar o produto final de volta ao fabricante.
Nos olhos deste escritor, múltiplos revenimentos são sempre vantajosos, a não ser que o tempo de revenimento envolvido seja muito longo.
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[1] Herring, Daniel H., Atmosphere Heat Treatment, Volume I, BNP Media Group, 2014;
[2] Herring, Daniel H., Atmosphere Heat Treatment, Volume II, BNP Media Group, 2015 (in preparation);
[3] Krause, G., Steels: Heat Treatment and Processing Principles, ASM International, 1990;
[4] Herring, Daniel H., “What Do We Really Know About Tempering?,” Industrial Heating, July 2007;
[5] Brandt, Daniel A., Metallurgy Fundamentals, 4th Edition, The Goodheart-Wilcox Company, Inc., 1984, pg. 216;
[6] Canale, L. C .F., Yao, X., Gu, J. and Totten, G .E. (2008) “A historical overview of steel tempering parameters,” Int. J. Microstructure and Material Properties, Vol. 3, Nos. 4-5;
[7] CQI-9, 3rd Edition, AIAG (Automotive Industry Action Group), issued January 2012, last update November 2013.