Lubrificante de matriz, parte VI – O inimigo da formação de camada: Leidenfrost

Muito tenho ouvido falar nos últimos dias sobre o efeito Leidenfrost. É a famosa gota d’água na frigideira quente que insiste em não se vaporizar e fica dançando sobre a superfície quente. Isso aplicado a um sistema de aplicação de lubrificante de matriz é simplesmente catastrófico. Como não há contato entre a gota d’água e a superfície quente sem evaporação da água da gota, não há possibilidade de formação de camada de lubrificante sólido.

Resumindo a literatura disponível a este respeito, parece que há uma relação entre tamanho da gota e temperatura da superfície quente. Parece que quanto maior a temperatura da superfície acima da temperatura de evaporação da água (estamos falando especificamente de dispersões de sólidos em água), maior será a radiação de calor, e quanto maior a gota, maior será a probabilidade de formação do efeito Leidenfrost.

É que a condição sine qua non (indispensável, essencial) para que exista o efeito, é necessário que uma parte da gota se sublime e salte um estado, no caso, direto do estado líquido para o gasoso pulando o estado de vapor. Ué? Vapor, gás d’água? Sim, o vapor d’água é o vapor saturado com forte incidência de umidade, gotículas, com propriedades similares às da água líquida, ótimo transportador de calor. O gás d’água é o vapor superaquecido, proveniente da radiação de calor da superfície quente, tem entropia elevada e por isso é um isolante térmico e se adere à superfície quente. Sim, então a gota dança em cima do colchão de vapor, mas este vapor que é a diferença. É vapor superaquecido e não vapor saturado ou simplesmente vapor d’água!

Logo, a “coisa” funciona assim: a gota que é arremessada contra a superfície quente entra na zona de radiação de calor e, se for suficientemente grande, tem a sua face sublimada. Imediatamente, o vapor superaquecido se adere à superfície quente e freia a chegada do restante da gota até a superfície quente por ser isolante térmico. À medida que a temperatura vai caindo, o superaquecimento do vapor acaba e finalmente a gota colapsa na superfície quente, se é que ela já não foi repelida e acabou formando camada em locais não desejados.

Mas, como lidar com este efeito? Há diversas tendências. As mais radicais falam sobre a eliminação do vapor superaquecido através de um forte sopro de ar (power blast), mas aí o pouco de lubrificante que porventura tenha conseguido formar camada vai ser arrancado também! O problema é que isso tudo acaba por reduzir a temperatura da superfície e podemos cair no outro extremo, que seria a baixa temperatura onde também não haverá formação de camada, por a superfície estar muito fria, abaixo de 100°C, e impossibilitar a evaporação da água.

Mais do que tentar remover, a solução parece evitar a formação do efeito Leidenfrost. Considerando o que dissemos acima, que para ocorrer o efeito de Leidenfrost as gotas têm que ser suficientemente grandes para que uma parte delas produza o vapor superaquecido que vai sustentar a outra parte, ou que haja a presença de gotas grandes no pulverizado que seriam responsáveis pela formação do vapor superaquecido e que sustentarão as gotas subsequentes evitando que haja contato com a superfície quente.

Desta forma, pode-se dizer que uma pulverização com gotas pequenas e homogêneas poderá impedir a formação do efeito Leidenfrost, pois com ausência do colchão de vapor superaquecido, todas as gotas farão contato com a superfície quente, evaporarão rapidamente e formarão a camada lubrificante.

Mas, e como quantificar os tamanhos de gota que evitam Leidenfrost? Sabe-se pela experiência que os sistemas de atomização interna produzem pulverizações grosseiras e obrigam o trabalho a temperaturas abaixo de 250°C. Caso ocorram temperaturas mais elevadas, há a necessidade de resfriar a matriz com lubrificante diluído, soluções maiores ou com água para possibilitar a formação de camada. Partículas de grafite coloidal (1 a 3 μm) nucleiam gotas de pulverizado menores e conseguem driblar o efeito Leidenfrost. Nem todo sistema de atomização externa produz a pulverização que evite Leidenfrost.

Considerando que todos os parâmetros se aplicam no ponto de atomização, no leque de saída para o ambiente, onde reina a pressão atmosférica, é necessário que seja obedecida a relação de seções de saída, sendo 3:1 (ar:lubrificante) e as pressões adequadas. Qualitativamente, por regra experimental, a pressão de lubrificante deve ser metade da pressão de ar, quanto menor, mais finas serão as gotículas. Fala-se em soft spray.

Na experiência do IFUM (Instituto de Técnicas e Máquinas de Conformação – da Universidade de Leibnitz, da Alemanha), apresentada na parte V desta coluna, chegou-se a um resultado onde 90% das gotículas eram de 22 μm. É provável que na prática se possa trabalhar com gotículas da ordem de 50 μm sem perigo do efeito Leidenfrost.

Sem Leidenfrost atrapalhando, a formação de camada será rápida, suave e eficiente até a temperatura de molhamento do lubrificante, ou um bom resfriamento da superfície da matriz até que o lubrificante possa formar camada.

 

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